Uma coincidência estar frio? Lábios enregelados, visualizei os amigos de Cidelma, em pé diante da entrada. Por mais que as flores estivessem em toda a parte, não havia a contentação primaveril. Desci do carro e minha guia me levou às filhas, as quais encontrei naturalmente abatidas. Dali por diante, caminhei, da forma o mais calculada que pude, pelas rodas de amigos e familiares – abraçando, ouvindo, coligindo fragmentos de uma pessoa. Era uma forma de conhecer alguém que não pude e nem poderei mais conhecer por enquanto.
Um velho conhecido de uma congregação veio me cumprimentar. Apesar de eu ter traçado o que falar, o homem trouxe-me um conselho. Por baixo do blazer preto, fiquei entre estarrecido e maravilhado. Ali estava eu, um jovem pastor, com um currículo de outros velórios, revisando o que falar, quando, de repente… Ora, se não é Deus!
O conselho de um homem simples se mostrou oportuno. Senti que o Senhor falava através do texto bíblico de João 11. Os olhos obnubilados pela perda se voltavam para, esclarecidos pela emoção da fé, acompanhar outro sepultamento. Não Cidelma, Lázaro. Não em uma capela, mas na tumba em Betânia. Lázaro.
Ainda tenho perante mim o cimento na pá. Uma mão ágil espalhando a massa cinzenta pelos tijolos. Pronto! Estava erigida a mureta, separando Cidelma de seus queridos. Mas não por muito tempo. Numa manhã de sorrisos, a voz que chamou Lázaro despertará os ouvidos crentes. A avó que teve um câncer terminal. A adolescente atropelada. O menino pelo qual a igreja inteira orou. Os que morreram em Cristo respirarão não o ar do mundo finito em que viviam (e vivemos), mas encherão seus pulmões com a atmosfera da eternidade.
“Disse-lhe Marta: Sei que ele há de ressurgir na ressurreição, no último dia. Declarou-lhe Jesus: Eu sou a ressurreição e a vida; quem crê em mim, ainda que morra, viverá; e todo aquele que vive, e crê em mim, jamais morrerá. Crês isto?” João 11:24-26