sexta-feira, 29 de julho de 2011

Rio, ou Como depreciar um povo e ficar milionário

Quando o avião em que eu estava passou ao lado do Pão de Açúcar e vi aquele mar, aquela praia (e antes “da janela vi o Corcovado, o Redentor, que lindo”), eu me convenci: o Rio de Janeiro continua lindo... mas aqui de cima. Mas que nada. Passei 3 dias na cidade desfrutando a maior, ufa, tranquilidade.

A animação Rio te dá essa impressão logo no começo. Imagens aéreas da cidade maravilhosa. E logo a seguir, imagens nada maravilhosas do povo da cidade. O esplendor técnico do filme é de encher os olhos, mas a visão depreciativa do carioca (e por tabela, do brasileiro) só pode ser fruto de uma cegueira social.

Não estou pedindo que a Disney as produtoras roliudianas nos mostrem em nossa teia complexa de comportamentos. Até porque ninguém se importa com os estereótipos quando eles são texanos, mexicanos , muçulmanos ou portugueses, né? Mas a preocupação do diretor Carlos Saldanha (o mesmo de A Era do Gelo) em ser complexo e sofisticado está só no magnífico uso das cores para pintar os cenários e os personagens aves.

A história do filme se passa no carnaval. Então, todo mundo na cidade só pensa em cair no samba. Só o personagem principal, Blu, uma ave criada nos Estados Unidos, diz a certa altura que não gosta de samba: “É sempre o mesmo ritmo: tico-tico-lá-lá-lá, tico-tico-lá-lá-lá”. Essa fala irônica, claro, vai se converter em deslumbramento na passarela do carnaval.

Se de cima vemos as belezas naturais, de baixo só se mostra traficantes de aves, favela, criança abandonada, gente assistindo futebol, gente sambando, gente sambando na praia, sambando em casa, sambando na faixa de pedestre, cachorro sambando, arara sambando... e macaquinhos assaltando turista (yes, los macaquitos). Enfim, todo aquele mostruário já bem conhecido dos estrangeiros: o Brasil é só folia e carnaval. Ah, sim, e trombadinha também.

Rio tem lá seus momentos engraçados e criativos. Mas o saldo que ficou pra mim é outro: o filme consegue depreciar o povo de um lugar e ainda faturar uma grana com isso. Uma sátira ao país é uma coisa. Nós mesmos fazemos troça e rimos do Brasil. Outra coisa é tratar disso como algo tão natural e intrínseco do país como um pé de bananeira.

O Brasil não é só carnaval, mas nosso povo é carnavalizado até bem depois da Quarta-Feira.

E quem, assim como eu, não gosta de carnaval? Aí, bom sujeito não é; ou é ruim da cabeça ou doente do pé. Ou doente da asa, como Blu, que só aprende a voar, claro, no Brasil.

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